quinta-feira, 17 de junho de 2010

Não temos grupo

Não colocando em questão o incondicional apoio ao meu país, tenho grandes dúvidas quanto à qualificação portuguesa para os oitavos do Mundial'10. Não é só o empate, a tímida exibição frente à Costa do Marfim ou até mesmo ainda os fracos amigáveis de preparação. Na minha opinião não há a familia de 2004, o espírito de grupo e sacrifício que viamos na era Scolari, o eterno "um por todos e todos por um".
Presentemente assistimos a uma selecção demasiada focada no actual 2º melhor jogador do mundo. Não questiono a qualidade do CR7 que bem mostrou esta época ser muitas vezes capaz de levar um Real Madrid às costas, mas... chegará? Em terras de 'nuestros hermanos' apesar da fantástica colaboração de Gonzalo Higuaín (27 golos), o poderoso colectivo catalão levou novamente a melhor.
Não seria melhor 11 a jogar para o mesmo objectivo do que 10 a jogar para um craque?
O futebol é um desporto colectivo. É bastante positivo haver desequilibradores, génios da bola mas mesmo esses sem os outros 10 o que ganham? Quem é Messi sem Xavi e Iniesta a tomarem conta do meio campo ou não menos importante Piqué e Puyol a defender?
Também bastante importante é o 12º jogador que o professor Carlos Queiróz não soube conquistar. Alguém se lembra que Scolari colocou quase 10 milhões de bandeiras por esse país fora? Tanto ou mais importante do que ter alguém que saiba orientar a equipa penso ser ter quem saiba jogar com lado psicológico. Infelizmente não enquadro Queiróz em nenhum dos requisitos.
Nestas competições que praticamente se baseiam num "mata-mata", com maior margem de erro nos primeiros jogos, é essencial ter um grupo unido, coeso, aliado a um povo contagiado pela febre do futebol, pela emoção que é jogar um grande torneio como este, principalmente quando se joga fora das suas fronteiras. Portugal, versão 2010, partiu para África do Sul com a bagagem cheia de critícas e com o pensamente num apuramento pouco conseguido. Visto isto, iremos longe?



P.S.: Vou matando saudades dos nosso momentos 'família Scolari'

terça-feira, 1 de junho de 2010

Pereirinha

Alto e pára o baile!

Porra: prefiram o inha

Se ele fosse um herói nunca seria o Rocky. Esse não. Esse tem holofotes a mais. Cagança a mais. No máximo o Clark Kent. Um simples jornalista que ninguém sabe que é deus. Ou o Watson do Sherlock. Aquele gajo que nunca aparece. O que ninguém conhece. O que nem sequer faz questão de aparecer. Faz o seu trabalho. Tenta fazer o melhor que pode. E é tudo. Veste mal. Penteia-se ainda pior. Não conduz topos de gama nem tem brincos nas orelhas. Não quer dar entrevistas e parece que fala a medo. Cada palavra é em esforço. Como se quisesse dizer que faz o que faz - e o que faz é jogar futebol. Para ele um jogador de futebol não tem de falar. Não tem de aparecer em festas nem abrir a porta de casa aos flashes. Para ele um jogador de futebol não tem de ser o que levanta as bancadas com um drible, com um gingar do corpo, com um golo estratosférico. Nops. Ele tem os pés no chão. Os dois. E é simples. Tão simples que assusta. Para ele um jogador de futebol faz o seu trabalho. E ele faz o seu. Sem brilhantismo, diz-se. A milhas de outros diamantes que, como ele, saíram da encantada Alcochete. E ele não reage. E ele não diz "alto e pára o baile". Alto e pára o baile!Não é Cristiano Ronaldo. Não, não é. Não tem o poder físico, a irreverência, o arrebatador desvario do Cristiano que desde sempre assim foi. Não é o Ricardo Quaresma. Não, não é. Não tem aquele jeito indiferente de fazer dos adversários simples mecos que têm de ser controlados. Simples chiclets que têm de ser mascadas. Não faz da trivela um objecto de arte. Não. Ele não é nada disso. E no entanto.No entanto foi importante por onde passou. Em todos os escalões. Em todos os momentos. Nas selecções, nos clubes. Com este ou com aquele treinador. E no entanto. No entanto tem asas nos pés. Como se tivesse uma velocidade a mais. Uma sexta, uma sétima. E no entanto. No entanto se não é o Cristiano, se não é o Ricardo, porque raios é que ele não pode ser o Simão? O Simão que é Judas sem retorno em Alvalade. O do "Sexy Hot". Sim. Ele pode ser o Simão. O Simão da velocidade, da regularidade, da vertigem com controlo. E sobretudo o Simão dos cruzamentos que dão golo. O extremo que olha e coloca. Sem rodrigos. Bola na área. Em forma de banana. E golo. Porque não pode ele ser Simão? Porque tem ele de ser o novo Cristiano, o novo Quaresma, o novo qualquer raio que o parta? Porque têm de o diminuir sob o peso de quem ele não pode ser? De quem muito poucos, em Alcochete como no mundo, podem ser? Sem rodrigos. Alto e pára o baile. Deixem-no ser Simão. A milhas de ser génio como Simão está a milhas de ser génio. A milhas de ser o sex symbol das adolescentes de todo o mundo como Simão está a milhas de ser o sex symbol das adolescentes de todo o mundo. A milhas de tanta coisa. De tanta tanta coisa. Mas capaz de ser o que Simão é ao lado de Ronaldo. Um utilitário. O Smart que, orgulhoso, está estacionado ao lado dos Ferraris, dos Porsches. E é também dos Smarts que se faz o sucesso. Mourinho que o diga. Mourinho não tem, sobre a relva, Porsches. Nem que, depois de chegarem às suas mãos, eles pareçam Ferraris. Ou até Rolls-Royce. Milito é um Fiat Punto kitado. Sneijder foi resgatado na sucata. E virou Bentley. Mas ele. Regressemos a ele. Ao gajo que não é Cristiano, o Ronaldo. Nem é Ricardo, o Quaresma. O gajo que se esconde em si mesmo. Como se tivesse medo de ser feliz. Como se tivesse medo de dizer o que tem de dizer. O que eu digo: alto e pára o baile.Ouve-se que vai para o Braga. Quando se devia ouvir todo um estádio a cantar-lhe o nome. Fala-se que não tem dimensão para o Sporting. Quando se devia falar que desde há muito que não se vê em Portugal quem faça um corredor com tanto equilíbrio ataque-defesa como ele. E ele cala. E ele vai para o treino, calado. Como sempre. Desde sempre como sempre. Fazer o seu trabalho. Como se não soubesse que não. Como se não soubesse, como eu sei, que só precisa de estar. Estar de verdade. Em campo. Noventa minutos. Noventa minutos aqui. E depois noventa minutos ali. Só precisa de estar. Estar a sério. Com confiança. Com as bancadas que estranhamente o assobiam do seu lado. Basta isso. Estar. Para fazer o que sabe. Trabalhar. É isso ser jogador de futebol. Não lhe esperem que insultem um adversário que lhe dá uma marretada. Nada disso. Ele levanta-se, em silêncio, aceita a mão e o pedido de desculpas. E volta a fazer o que sabe. Trabalhar. De cá para lá e de lá para cá. Naquele corredor direito como na vida. Não lhe peçam que faça uma "cueca" ou um passe de letra. Ele prefere ir directo ao assunto. Velocidade, espaço. Cruzamento. Para lá - onde se faz a diferença. À espera de que apareça um Rolls-Royce. Daqueles que custam balúrdios e dizem que são craques. E quando lhe perguntarem de quem é mérito do golo ele dirá o que sempre diz: do trabalho. E continua lá, a fazê-lo. Simplesmente a fazê-lo. Cabisbaixo. Quase triste. Apagado. Mas confiável. O anti-clímax em forma de extremo. Para o Braga? O tanas. Deixem-no trabalhar. Esqueçam os vics e os lovs. Prefiram o inha. Português de gema. Um homem de confiança. Poucochinho? Sem dimensão para o seu Sporting? Já chega. Enough is enough. Porra, puto. É agora. Alto e pára o baile.

Texto: Pedro Chagas Freitas.